Castro no Teatro Nacional São João
Castro no Teatro Nacional São João
Com Castro (1598), do poeta António Ferreira, Nuno Cardoso instala-se pela primeira vez no território de um cânone da dramaturgia portuguesa, pioneiro da tragédia clássica em Portugal. E quer habitar esta ficção literária, ela própria oferecendo uma leitura particular do drama histórico/lenda/mito dos amores de Pedro e Inês, para a dar a “ver com outros olhos”, revelando-lhe a modernidade e densidade intrínsecas, veladas pela poesia da linguagem e pela elocução. Um imenso palco-casa-país, espécie de maquete gigante dos espaços da ação, célula familiar primordial e claustrofóbica, coloca-nos face à intimidade concreta de personagens que se revelam cativas de si próprias e da sua irredutibilidade. Em Castro, como em A Morte de Danton, a questão da utopia (do amor, como da revolução) é crucial. É o seu negro avesso o que se expõe: o amor/desejo e o poder como vício e caos, como prerrogativa, impunidade e prepotência, como cegueira que “escurece daquela luz antiga o claro raio”. E como esse escurecimento tolda a decisão e se replica, tingindo de sangue e vingança o tecido familiar, num peculiar deslocamento do centro de Castro de Inês, e da razão de Estado como ficção e moral, para Pedro, na sua relação especular com o pai, Afonso IV. “Que estrela foi aquela tão escura?”
Castro no Teatro Nacional São João